Bombas humanitárias

(Publicado no Jornal Metro, 24/3/2011)

Nas revoluções árabes, passámos da encantadora fase Twitter para a mais barulhenta fase das bombas. Estava tudo a ser tão bonito. Tinha de vir um qualquer Khadafi estragar tudo. O presidente Obama, eleito para acabar com o belicismo de Bush e restaurar “os laços” com o mundo islâmico, já tem a sua própria guerra. E o mesmo se diga dos europeus, outrora tão orgulhosos do seu “soft power”.

Esta guerra mal atamancada nasceu da incapacidade de Obama e dos europeus para pensarem o problema da liberdade no mundo islâmico. Depois de Bush, conferiram legitimidade às ditaduras locais e acreditaram na sua estabilidade. Só que os próprios árabes não eram da mesma opinião. Recusando a “agenda da liberdade” da anterior administração e apostando nas autoridades vigentes, os ocidentais ficaram sem saber o que fazer das revoluções. Quando a matança de Khadafi ameaçou estragar a sua imagem idílica (o Facebook, etc.), tiveram de improvisar uma guerra de desespero, invocando “razões humanitárias”.

Mas esta não é uma guerra humanitária. É, tal como no Iraque, uma guerra para mudar o regime, com a diferença de que os ocidentais não o reconhecem, o que torna tudo muito perigoso. Uma guerra para mudar o regime obrigaria a um compromisso, como no Iraque, em permanecer até se criarem novas instituições. Mas existiria então o custo de enviar soldados e burocratas para o terreno. Em vez disso, temos uma guerra em que o heroísmo ocidental se mede até ao último rebelde líbio morto. Porque se não é para mudar o regime, a alternativa é a mera participação numa guerra civil e a destruição da Líbia enquanto país. Pode alguém dizer que se trata de ajudar o lado anti-governamental e deixá-lo, depois, reconstruir. Mas alguém sabe quem são realmente os rebeldes, para além daqueles beduínos de que os fotógrafos tanto gostam cavalgando o deserto nas suas carrinhas pick-up? E se os bombardeamentos à distância não funcionarem, o que fazem os ocidentais? Vão-se embora, com um país a arder às costas?

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