O capitalismo salvo pelo Estado?

(publicado no jornal Meia Hora, 31/1/2008)

Nos tempos bons, os banqueiros internacionais levam a vida a explicar-nos como é preciso menos Estado. Mas é interessante como, com a crise vigente, tanto se têm assemelhado a patéticos “subsídio-dependentes”, pedinchando ao Estado que os salve das consequências dos seus riscos. Começam por querer que os bancos centrais baixem as taxas de juro, de forma a facilitar a satisfação de dívidas e o empréstimo inter-bancário. Mas a verdade é que, neste contexto, embora com alguma imprecisão, se pode dizer que baixar taxas de juro corresponde a subsidiar empresas financeiras em dificuldades. Uma das presumíveis vantagens dos sistemas de mercado seria deixar empresas entrar em falência, fazendo desaparecer maus intérpretes e abrindo as portas aos bons. Afinal, parece que não  é assim com os bancos.

Mas não se ficam pelas taxas de juro. Também pedem aos governos que estimulem a economia pelo aumento da despesa. E os governos vão respondendo positivamente. Pelo menos o americano, que já propôs um pacote de estímulo. Até o FMI, normalmente tão estrito nestas matérias, veio recomendar o mesmo. Não surpreenderá que se sigam os governos europeus. Onde está o heroísmo da redução do Estado? Diga-se em abono da verdade que o caos gerado por uma insolvência generalizada do sistema financeiro seria política e socialmente inaceitável. Mas é como dizia Martin Wolf no Financial Times no outro dia: os banqueiros privatizam os ganhos facilmente, mas socializam as perdas com igual facilidade. Ou seja, quando ganham o mérito e o retorno é seu, quando perdem imploram que os salvem. Ora, se não conseguem lidar com as suas perdas, e a sociedade também não, porque deverão lidar com os ganhos?

Não acaba aqui o papel do Estado nesta crise. Veja-se o caso dos fundos soberanos (os fundos governamentais de países com balanças de pagamentos superavitárias, como os produtores de petróleo ou os grandes exportadores, como a China), que se vêm posicionando nos grandes bancos de investimento desesperados por mais capital (Merrill Lynch, Citigoup, Morgan Stanley ou UBS). Está muito bem: é lá que está o dinheiro, é lá que é preciso ir buscá-lo. Mas decididamente o capitalismo não parece a mesma coisa que em tempos já foi.

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