(Publicado no jornal Metro, 25/2/2010)
Como um acidente de automóvel, por muito que queiramos evitar, não conseguimos deixar de olhar para as escutas que vão sendo publicadas por aí. Acabam por ser pouco surpreendentes, limitando-se a pôr na primeira pessoa aquilo que o cidadão comum sempre suspeitou que os políticos faziam: espertices mais ou menos saloias, manigâncias e abusos (de poder e de linguagem). Mesmo que uma pessoa queira restaurar a “dignidade da política”, torna-se difícil perante o espectáculo de esquemas, entremeados de (e cito) “pás”, “gajos” ou “m…s”.
No meio disto tudo, duas coisas são interessantes. Primeiro, os projectos políticos dos envolvidos, que são… nenhuns. Todos eles são pessoas de esquerda. Rui Pedro Soares, por exemplo, o caso mais citado, passou (na juventude) das t-shirts de Che, mais o apoio à liberalização do aborto e da droga (tudo coisas muito modernas e bastante giras) e a moção à liderança da JS “Nós vamos pela esquerda”, para os voos de jacto privado entre Lisboa, Madrid e Milão, a fim de negociar “coisas” com Cebrián, Figo e Mourinho. Segundo o amigo Paulo Penedos, “o gajo conhece toda a gente”. E ideias para o país? Ignora-se.
A outra coisa interessante é o dinheiro. Parece que o único método destes ases da estratégia é despejar dinheiro. Mete-se um jogador de futebol no bolso por uns milhões ou resolve-se o “problema da TVI” com outro tanto. Numa das escutas publicadas, Soares queixa-se a Vara da dificuldade em resolver o “problema” da Cofina. Vara não tem dificuldade em responder-lhe: “Isso compra-se”. Noutra escuta, Paulo Penedos fala de certos montantes, provocando a agora famosa reacção de Marcos Perestrello (certamente movido por preocupações sociais): “essa m… em subsídios de desemprego…” Não se trata apenas de estratagemas. Trata-se da facilidade em congeminá-los graças à bolha de dinheiro em que os envolvidos nas escutas vivem. São aprendizes de feiticeiro a nadar numa quantidade obscena de recursos.
Assim também eu, mas parece que agora é assim.